quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

A cor e a sensibilidade de Júlio Pires


Júlio Pires
Da sua página pessoal (que vale a pena visitar em http://www.juliopires.com/ ) transcrevo:

"Júlio Pires é natural de Ílhavo, nascido a 30 de Outubro de 1964. Autodidacta, cria o seu próprio percurso no caminho das Artes Plásticas, frequenta em 1987 um curso de desenho e pintura no Grupo A.C.V. na Fundação Calouste Gulbenkian, sob a direcção de Pedro Andrade. Profissionalmente, foi pintor na Fabrica de Porcelanas da Vista Alegre. Contudo é nas telas que encontra a sua realização pessoal, a sua forma de expressão."




















segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

A inquietação das palavras de Domingos Cardoso


Conheço o meu amigo Domingos Freire Cardoso desde os inícios dos anos finais dos anos 50 quando o então Liceu Nacional de Aveiro era o ponto de encontro das nossas esperanças de adolescentes. Desde essa época que lhe ficou o jeito de lutar contra o sossego com que tantas vezes nos escondemos do cinzento amargo das nossas vidas.
Engenheiro de formação e professor de profissão, transformou-se a pouco e pouco num trabalhador de palavras com as quais procura redescobrir a seiva da terra da sua infância.






Do seu livro
"O Terceiro Vértice",
que publicou e editou em 2003,
escolhi três poemas:




Voltar atrás?...


Ao olhar para mim não me revejo
No petiz que eu fui, jovem que sonhou,
Parecendo que a fé já se esfumou
Na tortuosa estrada em que mourejo.
Em adulto perdi todo o ensejo
De fazer o que sempre me animou
E a vida tão sonhada se mudou
De grande sinfonia em fraco harpejo.
No tremor alquebrado dos joelhos
Sinto que foram vãos esses conselhos
Que tanto me previram este fim.
Tentar voltar atrás de nada vale
Por não haver regresso que me cale
A saudade que sofro já por mim!

Estrada



Olhando as minhas mãos, assim despidas,
Tão vazias de anéis e compromissos,
Tão desnudas de feitos e feitiços
Penso que as intenções foram perdidas.
Descubro em minhas rugas esculpidas
As marcas dos propósitos postiços
E, nos olhos, de brilhos já mortiços,
A dor de renovadas despedidas.
Tive amor no meu peito e não o quis,
Senti um sonho à mão e nada fiz
Por julgar que este mundo era ilusão.

Tendo de meu tão pouco ou quase nada
Vejo, no fim da estreita e erma estrada,
Sorrindo, à minha espera, a solidão.





Sabedoria
(dedicado à minha Mãe)



Sabia
espalhar o estrume,
cavar a terra,
lançar a semente.
Regava o milho,
colhia a espiga,
armazenava o grão.
Mas não sabia... quem foi D. Dinis.

Sabia
apanhar a erva,
ordenhar as vacas,
salgar o porco.
Peneirava a farinha,
tendia a massa,
cozia o pão.
Mas não conhecia... a padeira de Aljubarrota.
Sabia
caiar a casa,varrer o chão,
pontear a roupa.
Punha flores na jarra,
pregava um botão,
vestia-se lavada.
Mas não sabia... escrever a palavra Mulher.
Sabia
preparar um remédio,
esconder uma angústia,
rezar uma oração.
Penteava os filhos,
aconchegava-lhes a cama,
não comia para lhes dar.
Mas não sabia... ler a palavra Mãe.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Augusto Nunes, o poeta que veio do mar



Sobre este poeta ilhavense escrevi um dia
"...Os poetas vivem no desassossego de fazer do efémero de cada gesto o ponto de partida para a eternidade. E é dessa batalha constante que se faz a força de muitos dos poemas de Augusto Nunes..."




Em Março de 2006, numa edição da Secção Cultura da A.C.D. Os Ílhavos, publicou o livro
"Os Espelhos da Água"
do qual aqui vos deixo hoje três poemas.






Espelho de água



acendem-se as cidadelas
confundem-se com elas
as estrelas...
e os espelhados
espalhados
brilhos delas...
p'lo debrum das casarios
as vigias dos navios
amarelas
parecem sóis
e as dos albóis
as velas
da luz dos lares...
da cruz dos altares
das capelas...

revérberos de melancolia
que em noites de calmaria
dão à poesia
o tom das aguarelas...



Pregões



saía de casa...manhãzinha cedo...
e mal entrava na rua de Espinheiro
gaguejando no pregão e no praguedo...
acordava o povo... um barateiro...
também pelo cantar do passaredo
prometia a taluda um cauteleiro...
e beijando o sol ainda o dia a medo
já aos cães se ria um burro de azeiteiro...
pousando as canastras no lagedo
discutiam as peixeiras de nariz no dedo
porque a "vivinha da costa" duma delas tinha cheiro...
até que dos beiços de um funileiro
um som de gaita vinha a terreiro
juntar seu banzé ao sublime enredo...




O Aguça


de gaita de beiços anuncia
que chega
de roda galega
à freguesia...
arranja pratos
panelas velhas
agrafa selhas
sola sapatos
amola facas...
as tesouras todas...
as das costuras e as das podas
reforça forras fracas
solda latas e latões a estanho
como fundilhos rebita chapas
crava ilhóses na dobra das capas
e pica o gume cego do gadanho...
cega os olhos das enxadas e marretas
prega pedaços de pneu no pau das chancas
espeta protectores nas tamancas
e endireita às umbrelas... as varetas...
a mim agora só me afia os versos
até que chegue o caldeireiro...
para que num dia vindimeiro
me desempene os que por aí há dispersos...

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

A subjectividade da objectiva de Carlos Duarte

(Carlos Duarte numa fotografia de Carlos Alberto Rocha)

O meu amigo Carlos Duarte tem, ainda hoje, apesar muitos anos de amor por Ílhavo (onde vive), aquele jeito romântico de quem nasce na cidade de Coimbra à beira do Mondego eterno. E talvez por isso mesmo nunca tenha renunciado a uma velha paixão sempre publicamente assumida: a de nos mostrar o seu (e muitas vezes nosso) quotidiano através da subjectividade da sua objectiva fotográfica...


...E em 24 de Novembro de 2007 decidiu publicar em Ílhavo o livro



40 anos de fotografias


Da introdução escrita pelo próprio Carlos Duarte, atrevo-me a recortar estes breves excertos:


"...

Fotografar para mim sempre foi e continua a ser uma forma de comunicar e dar a conhecer aos outros o que se passa, muitas vezes mesmo ao nosso lado e que muitos teimam em não ver e outros não conseguem visualizar.

...

Este livro é a forma que tenho em mostrar uma pequena parte da minha história , deste país e de Ílhavo. Não pretendo que seja um livro de "fotografia", mas um livro de fotografias, tendo muitas sido "companhia" de textos em vários jornais e outras ilustraram revistas e livros.

... "






















segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

O poeta cantor Geraldo Alves




Geraldo Alves, natural de Ílhavo, é um velho amigo e companheiro de muitas horas de cantigas de palavras abertas. Com Artur Ramisote formou um duo de cantautores que ultrapassou decididamente os limites do sucesso obtido em festivais e espectáculos locais.

Em 2003 publicou o seu primeiro livro "Cravos com espinhos" numa edição da ACD "Os Ílhavos".









É deste livro que escolho três poemas:







O meu país




No meu país
existe um rio de ternura
corre nas veias dos poetas do meu povo
o meu país
faz poesia da amargura
e da loucura
vinho velho e sangue novo


O meu país
chora na voz de uma guitarra
embebeda-se no sangue das touradas
ri do passado
e da saudade a que se agarra
cai de joelhos
com a alma torturada


O meu país
é uma criança irrequieta
brinca com a vida
hoje perde amanhã ganha
e à noitinha
mal se deita logo aquieta
cavalga o sonho não há nada que o detenha


O meu país
de cheiro a vinho e maresia
espuma do mar
envelhecida de emoções
vive do sonho
renovado dia a dia
e das mãos nuas calejadas de ilusões



E os olhos inquietos beijando o mar







Maria



Maria dos ventos incerta
aberta nos livros da paz
prenhe de sonhos e poentes
quentes
beijos que não dás



Maria dos montes caída
traída pelos donos da luz
feita perfume num soneto
preto
canto que seduz


Sai dessa imagem de folia
que os teus lábios quem diria
nunca souberam a mel


Vai que o teu mundo oh Maria
tem teu ar de manhã fria
não és fúria de corcel



Maria das mãos retalhadas
cansadas de tanto labor
vendem-te a alma pelas ruas
cruas
rimas sem amor


Maria dos seios caídos
erguidos num gesto sem fundo
nunca permitas que uma quadra
errada
fique no teu mundo



Portas por abrir



Na terra onde nasci
os homens morrem sem ver
e os cravos que eu nunca vi
serão a força a beber

Que eu canto poetas loucos
portas abertas ao vento
e a noite e os gritos roucos
canções de raiva lamentos


fugi do tempo e o amanhã
sorriu p'ra mim
cantei amor a dor e o fim

saltei o sol bebi o mar
matei a morte
vesti o trigo abrigo bem forte

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

A arte do meu amigo Adélio Simões



Adélio Simões































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De uma exposição em Junho de 2004 na Galeria Municipal de Ílhavo :